E se a nossa verdade for uma ilusão? - Irineu Deliberalli
Falar de verdade é um tanto ambíguo, pois cada um tem sua verdade pessoal e ela é relativa ao momento, mas grande parte destas "verdades", que nos fazem desenvolver outros pensamentos e novas "verdades", estão relacionadas a comportamentos ou padrões aprendidos em nossas culturas, clãs sociais, núcleos familiares, ordens religiosas do nosso passado que se fazem presentes no nosso agora, e cada um destes elementos citados constituem o conjunto de nosso patrimônio da Mente Concreta.
Esta nossa Mente Concreta tem sido a causa da grande maioria do sofrimento humano, pois ela é um ser pensante e representa um arquivo importante do nosso desenvolvimento mental, mas ela se engana com a mesma facilidade com que um adulto pode tirar um doce de uma criança de no máximo 2 anos.
A característica principal da Mente Concreta é elaborar conhecimentos a partir daquilo que é observado, princípio que de maneira geral a Ciência tem usado para atingir o nível de conhecimento que é trazido a cada dia à humanidade, e ela é um dos elementos que nos ajuda a ficarmos no nosso aqui e agora da vida material.
Ela é um importante instrumento do desenvolvimento humano e necessária à vida material e ela é usada não só nos laboratórios de pesquisas, mas pelos juristas que fazem as leis, em investigações de vários segmentos entre outros tantos e em cada um de nós seres humanos, o seu desenvolvimento ocorre período de 7 a 11 anos, e de certa forma a partir daí ela comanda a conduta da grande maioria das pessoas que vivem encarnadas no planeta.
Esta fase concreta, irá fazer com que comecemos o processo de libertação social da família, pois até então, nós somos um produto originário do poder pensamente de nossa família e nesta fase começamos um novo caminho de socialização, escolhendo novos parâmetros, através dos colegas e modismos sociais.
Num estágio anterior de desenvolvimento, tínhamos ativada a Mente Abstrata, onde os sonhos, o imaginário e a realidade virtual eram nossas vivências principais, mas normalmente, esta fase infantil não é entendida e nem respeitada pela grande maioria das famílias, que sem saber jogam em cima da fragilidade de uma criança todas as suas dores e machucados emocionais trazidos também de suas infâncias.
Este choque onde a Mente Abstrata da criança e a Mente Concreta do adulto trazem enormes danos à civilização humana e ao seu desenvolvimento e aqui cabe algumas indagações: Como ficam agora os valores emocionais que a família nos passou? E os arquétipos familiares que herdamos? E os apegos de mães e pais que emocionalmente não liberam para vivermos nossas vidas e experiências, como ficam? E os arquivos das Memórias Extras Cerebrais que são os conteúdos de vidas anteriores a estas que estão ativados a partir dos 14 anos justamente para serem corrigidos e adequados à nossa essência divina, que normalmente não é manifestada?
A experiência profissional e minha própria história pessoal me apontam que fica uma mistura entre as duas mentes, pois não aprendemos a diferenciá-las e entendê-las como necessárias à nossa vida e desta maneira não as desenvolvemos de maneiras sadias e equilibradas e estes equívocos que a aprendizagem social nos passa acabam virando as "verdades" cheias de "inverdades" que todos nós acreditamos.
A Mente Abstrata quando está isenta de contaminações, nos leva à percepção de nossa "verdade de alma" que nos é passada pelo nosso Eu Superior, que só pode ser acessada pelo nosso coração e não pela mente/cérebro.
Quando conseguimos atingir esta percepção do coração, que o povo vermelho tanto sabe nos ensinar, estamos então diante de uma nova Mente, e ela nos traz uma "Consciência Baseada no Coração" e esta não é contaminada pelos enganos que foram introjetados nas duas mentes já citadas. Esta grande herança do povo vermelho à nossa civilização, pois ele é a única das raças que tem a "Consciência Baseada no Coração", nos permite escutar do nosso próprio coração as verdades sem os enganos que são tão comuns em todos nós.
Em 2009, durante um dos rituais Sagrados de Ayahuasca que estava dirigindo, no salão, todas as pessoas deitadas fazendo suas viagens e apenas umas poucas velas acesas, para dar ao ambiente a quietude e paz necessárias que o ritual requer, lembro-me de ter olhado para uma das colegas que estava fazendo sua viagem, a Zuíla, e ao vê-la coberta na cabeça com um xale, deu-me a impressão que o rosto dela era um daqueles cachorros Shar Pei que tem o rosto todo enrugado.
Parei e fixei o olhar nela, pois sabia que era ela que estava ali deitada, mas eu via um rosto de Shar Pei. Aí aquela voz que sempre fala conosco quando estamos sob o efeito da erva sagrada, me disse para olhar mais pelo salão, e comecei a olhar cada pessoa e em cada pessoa via alguma coisa que era real, pois eu as estava vendo, mas não era a realidade, pois alguma sombra se projetava e distorcia aquilo que era o real. E aí a voz concluiu: "Preste atenção à sua vida, pois não é tudo o que você vê é da maneira que realmente é. A mente nos engana o tempo todo. Observa mais, antes de dar sua opinião ou crer ou até julgar o que esteja vendo".
Guardei estes ensinamentos, mas naquele momento não os entendi na profundidade de que agora entendo. Precisei passar na minha vida pessoal por alguns enganos, pensando estar vendo a verdade, e as coisas não eram da maneira que eu as via.
Os conteúdos dos nossos arquivos fazem com que vejamos as coisas de maneira que a desejamos e não como são. As contaminações emocionais que recebemos nas duas mentes, por não termos sidos respeitados nesta fase determinante do nosso desenvolvimento que é do zero aos 7 anos, criam determinadas necessidades de corresponder às vontades dos outros, medos de errarmos, autocomiseração, necessidade de sermos aceitos, muitos medos e tantos outros fatores e todos eles acabam de maneira decisiva interferindo e contaminando o nosso entendimento da verdade que em muitas das vezes era apenas uma ilusão e nós não a víamos.
É comum ver em meu consultório pessoas com arraigadas verdades, e crêem de maneira contumaz em seus discursos e suas atitudes, mas, na prática, o universo mostra outra coisa, não permitindo que o caminho seguido se concretize, pois ele está baseado numa falsa verdade, verdade que é do ego e não do coração.
E quando isso acontece, a vida emperra, fica quase que paralisada esperando que venhamos a perceber o engano que nossa falsa verdade nos fez creditar. Se sua vida está parada em algum setor, uma dica: olhe suas verdades sobre aquele fato e pode ter certeza, elas precisam ser mudadas, pois se nossa verdade for uma ilusão, o universo nos dá a sua dica, paralisando-a, para que não caiamos num buraco muito fundo e apenas mudemos de atitude, refazendo o caminho até agora percorrido.